DIREITO INTERNACIONAL PÚBLICO E
PRIVADO
As relações internacionais, entendidas como a teia de laços
entre pessoas naturais e jurídicas que perpassam as fronteiras nacionais,
caracterizam-se pela complexidade. Com efeito, o universo do relacionamento
internacional, que, na percepção tradicional da doutrina, envolvia apenas os
Estados, abrange na atualidade um rol variado de atores, que inclui também as
organizações internacionais, as organizações não governamentais (ONGs), as
empresas e os indivíduos, dentre outros. Tais atores, e os vínculos que os
unem, formam a sociedade internacional, cuja dinâmica é pautada por diversos
fatores, associados, por exemplo, à política, à economia, à geopolítica, ao
poder militar, à cultura e, por fim, aos interesses, necessidades e ideais
humanos. Um dos elementos que contribui para determinar a evolução da vida
internacional é o Direito, especialmente o Direito Internacional Público, ramo
da Ciência Jurídica que visa a regular as relações internacionais com vistas a
permitir a convivência entre os membros da sociedade internacional e a realizar
certos interesses e valores aos quais se confere importância em determinado
momento histórico.
COMUNIDADE INTERNACIONAL X SOCIEDADE
INTERNACIONAL
A comunidade fundamenta-se em vínculos espontâneos e de caráter subjetivo,
envolvendo identidade e laços culturais, emocionais, históricos, sociais,
religiosos e familiares comuns. Caracteriza-se pela ausência de dominação, pela
cumplicidade e pela identificação entre seus membros, cuja convivência é
naturalmente harmónica.
A sociedade
apoia-se na vontade de seus integrantes, que decidiram se associar para atingir
certos objetivos que compartilham. É marcada, portanto, pelo papel decisivo da
vontade, como elemento que promove a aproximação entre seus membros, e pela
existência de fins, que o grupo pretende alcançar.
Conceituamos a sociedade internacional como um
conjunto de vínculos entre diversas pessoas e entidades interdependentes entre
si, que coexistem por diversos motivos e que estabelecem relações que reclamam
a devida disciplina.
CARACTERISTICAS DA SOCIEDADE
INTERNACIONAL
§ Universalidade: A sociedade internacional é
universal. Nesse sentido, abrange o mundo inteiro, ainda que o nível de
integração de alguns de seus membros às suas dinâmicas não seja tão profundo.
Com efeito, mesmo um Estado que adote uma política externa isolacionista deve,
no mínimo, se relacionar com o Estado com o qual tem fronteira
§ Heterogeneidade: A sociedade internacional é
heterogénea. Integram-na atores que podem apresentar significativas diferenças
entre si, de cunho económico, cultural etc. A maior ou menor heterogeneidade
influenciará decisivamente o processo de negociação e de aplicação das normas
internacionais, que poderá ser mais ou menos complexo.
§ Caráter interestadual: Parte da doutrina defende que a
sociedade internacional é interestatal, ou seja, que é composta meramente por
Estados. 3 Não abraçamos esse entendimento, superado desde que as organizações
internacionais se firmaram como sujeitos de Direito Internacional e que não se
sustenta diante da crescente participação direta de entes como empresas, ONGs e
indivíduos nas relações internacionais.
§ Descentralização: A sociedade internacional é
descentralizada. Nesse sentido, não há um poder central internacional ou um
governo mundial, mas vários centros de poder, como os próprios Estados e as
organizações internacionais, não subordinados a qualquer autoridade maior.
§ Coordenação: Ainda nesse sentido, podemos afirmar
que a sociedade internacional é caracterizada não pela subordinação, mas sim
pela coordenação de interesses entre seus membros, que vai permitir, como
veremos, a definição das regras que regulam o convívio entre seus integrantes.
§ Caráter paritário: Em todo caso, partindo da premissa de
que seus membros seriam apenas Estados, a sociedade internacional seria
paritária, em vista da igualdade jurídica entre seus integrantes.
§ Desigualdade de fato: Entretanto, a sociedade internacional é também marcada pela desigualdade de fato, corolário de sua própria heterogeneidade e do grande diferencial de poder entre os Estados, que ainda influencia os rumos das relações internacionais.
GLOBALIZAÇÃO
Definimos a globalização como um processo de progressivo
aprofundamento da integração entre as várias partes do mundo, especialmente nos
campos político, económico, social e cultural, com vistas a formar um espaço
internacional comum, dentro do qual bens, serviços e pessoas circulem da
maneira mais desimpedida possível. Na acepção mais comum na contemporaneidade,
refere-se ao forte incremento no ritmo da integração da economia mundial nos
últimos anos.
ALGUMAS DAS CARACTERÍSTICAS DA
GLOBALIZAÇÃO SÃO:
§ O aumento nos fluxos de comércio
internacional e de investimento estrangeiro direto (IED);
§ O acirramento da concorrência no
mercado internacional;
§ A maior interdependência entre os
países;
§ A expansão dos blocos regionais;
§ A redefinição do papel do Estado e de
noções como a de soberania estatal.
CONCEITO DO DIREITO INTERNACIONAL
PÚBLICO (DIP)
O direito internacional público regula a convivência entre os membros
da sociedade internacional.
o atual contexto internacional veio a
tornar evidente a necessidade de que os entes estatais e os organismos
internacionais atuem conjuntamente no tocante a temas que têm impacto direto
sobre a vida das pessoas e que, por sua complexidade, magnitude e capacidade de
gerar efeitos em mais de uma parte do mundo, exigem a cooperação
internacional, como a manutenção da paz, a promoção dos direitos humanos e a
proteção do meio ambiente. Com isso, o Direito Internacional Público passa
a tutelar não só os vínculos estabelecidos entre Estados e organizações
internacionais, como também uma ampla gama de questões de interesse direto de
outros atores sociais, como os indivíduos. No entanto, esse fenômeno ainda é
relativamente recente. Com isso, no esforço de conceituar o Direito
Internacional Público, a doutrina oscila entre uma visão tradicional e uma
perspectiva que considere o novo quadro das relações internacionais.
A doutrina majoritária considera o individuo como sujeito
do direito internacional, porque ele atua na sociedade internacional em prol
dos seus direitos individuais como pessoa. Ex: Maria da Penha.
OBJETVOS DO DIP
§ Reduzir a anarquia na sociedade
internacional e delimitar as competências de seus membros;
§ Regular a cooperação internacional;
§ Conferir tutela adicional a bens
jurídicos internacionais ou que a sociedade internacional decidiu atribuir
importância;
§ Satisfizer interesses dos Estados.
FUNDAMENTOS DO DIP
O fundamento do Direito Internacional
é objeto de debates doutrinários, que se concentram principalmente ao redor de
duas teorias: a voluntarista e a objetivista.
§ O Voluntarismo: É uma corrente doutrinária de caráter
subjetivista, cujo elemento central é a vontade dos sujeitos de Direito
Internacional. Para o voluntarismo, os Estados e organizações internacionais
devem observar as normas internacionais porque expressaram livremente sua
concordância em fazê-lo, de forma expressa (por meio de tratados) ou tácita
(pela aceitação generalizada de um costume).
· Elemento
vontade;
· Caráter
subjetivo;
· A
norma é obrigatória pela concordância das partes.
Obs: Para o voluntarismo o importando é
o sujeito e sua vontade, que tem papel principal
§ O Objetivismo: O objetivismo sustenta que a
obrigatoriedade do Direito Internacional decorre da existência de valores,
princípios ou regras que se revestem de uma importância tal que delas pode
depender, objetivamente, o bom desenvolvimento e a própria existência da sociedade
internacional. Nesse sentido, tais normas, que surgem a partir da própria
dinâmica da sociedade internacional e que existem independentemente da vontade
dos sujeitos de Direito Internacional, colocam-se acima da vontade dos Estados
e devem, portanto, pautar as relações internacionais, devendo ser respeitadas
por todos.
· Irrelevância
da vontade
· Caráter
objetivo
· Papel
central da norma é obrigatória pelo caráter de primazia que possui,
relativizando a soberania
Obs: Nessa teoria a norma tem um papel
central, a vontade é secundária.
ORDENAMENTO JURÍDICO INTERNACIONAL
não é difícil verificar que existe um ordenamento jurídico
internacional, formado por um conjunto de preceitos voltados a regular as
condutas dos membros da sociedade internacional e o tratamento de temas de
interesse global. Assim como os demais preceitos jurídicos, as normas
internacionais são obrigatórias e, com frequência, contemplam expressamente a
possibilidade de sanções no caso de seu descumprimento.
CARACTERÍSTICAS DO DIP
O Direito Internacional é um direito de “coordenação”, em
oposição ao Direito interno, que é de “subordinação”. Dentro dos Estados, as
normas são elaboradas por órgãos estatais, representantes de um poder soberano
capaz de se fazer impor aos particulares. Na ordem internacional, como não há
um poder central responsável por essa tarefa, a construção do ordenamento
jurídico é fruto de um esforço de articulação entre Estados e organizações
internacionais, que elaboram as normas internacionais a partir de negociações e
podem expressar seu consentimento em observá-las. Nesse sentido, o Direito das
Gentes, quando entendido como Direito interestatal, caracteriza-se também por
suas normas serem criadas por seus próprios destinatários.
Ricardo Seitenfus inclui a fragmentação como característica
do Direito Internacional, referindo-se à heterogeneidade de suas normas, cujos
traços expressivos são a variedade de matérias tratadas e de condições em que
são elaboradas (Estados e interesses envolvidos, contextos históricos,
diferenciais de poder etc.). 18 A diversidade dos temas regulados pelo Direito
das Gentes é também explicada pelo fato de que os Estados e as organizações
internacionais têm interesse em regular diferentes tipos de questões, o que tem
levado, aliás, ao aparecimento de ramos específicos do Direito Internacional,
voltados a atender as peculiaridades de certos problemas, como o Direito
Internacional dos Direitos Humanos, o Direito Internacional do Trabalho, o
Direito Internacional do Meio Ambiente etc.
os tratados normalmente determinam ações que os Estados
deverão efetivar dentro de seus territórios, como no caso do Protocolo de
Quioto, ato internacional que visa a reduzir a poluição ambiental no mundo e
que, para isso, deverá logicamente levar à redução da emissão de poluentes
pelas indústrias nacionais, ou dos tratados de direitos humanos, que não
lograrão contribuir para a proteção e a promoção da dignidade humana no mundo
se os Estados, sob cuja jurisdição se encontram as pessoas naturais, não
garantirem o gozo dos direitos consagrados em seus textos nas respectivas áreas
territoriais.
A cooperação
internacional entre os Estados: uma das mais evidentes vertentes do Direito Internacional
na atualidade é a da regulamentação da cooperação internacional. a
cooperação internacional não é meio apenas para combater problemas, mas também
constitui instrumento adicional, pelo qual os Estados podem promover seu
desenvolvimento económico e social. Como exemplo disso temos os mecanismos de
integração regional. Por fim, a cooperação internacional permite regular a
administração de áreas que não pertencem a nenhum Estado e que são do interesse
de toda a humanidade, como o alto-mar e o espaço extra-atmosférico. Com tudo
isso, os Estados articulam ações conjuntas referentes aos temas de interesse
internacional, formando esquemas de cooperação compostos por marcos legais
consagrados em tratados e, às vezes, por arcabouços institucionais, conhecidos
como “organizações internacionais”. Exemplo do funcionamento da cooperação
internacional refere-se à energia atómica, cujo uso para fins não pacíficos
pode provocar problemas em escala global.
A jurisdição internacional: A sociedade internacional apresenta
certas peculiaridades, como a descentralização e, por conseguinte, a
inexistência de um governo mundial. É certo também que os Estados, por serem
soberanos, se preocupam em limitar a interferência externa em assuntos que
entendem ser de sua alçada. Entretanto, tais circunstâncias não impedem que
existam órgãos encarregados de dirimir controvérsias relativas ao Direito
Internacional e de aplicar suas normas a casos concretos, ainda que nem sempre
tais mecanismos funcionem nos mesmos moldes de seus congéneres estatais. Os
entes que exercem a jurisdição internacional normalmente são criados por tratados,
que definem as respectivas competências e modo de funcionamento. Podem ser
judiciais (seguindo o modelo das cortes nacionais), arbitrais ou
administrativos, como as comissões encarregadas de monitorar o cumprimento de
tratados.
Em geral, as cortes e tribunais internacionais não têm o
poder de automaticamente examinar casos envolvendo um Estado, ainda que este
seja parte do tratado que os criou. É o caso da Corte Internacional de Justiça
(CIJ), que só pode apreciar um processo envolvendo um ente estatal se este
aceitar os poderes desse órgão jurisdicional para julgá-lo em um caso
específico, ou se o Estado tiver emitido, previamente, uma declaração formal de
aceitação da competência contenciosa dessa Corte, que lhe permita conhecer de
litígios relativos a esse ente estatal sem necessidade de qualquer declaração
adicional.
As dificuldades para impor sanções no Direito Internacional
podem estar relacionadas à ausência de órgãos internacionais centrais
encarregados da tarefa, assim como ao fato de que a aplicação dessas sanções
normalmente depende da articulação dos Estados, o que pode não ocorrer dentro
de determinado contexto.
Em todo caso, o Direito Internacional dispõe de instrumentos
de sanções. Exemplos disso são o envio de tropas da ONU para regiões em que
esteja sendo violada a proibição do uso da força armada, a expulsão de
diplomatas que abusem de suas imunidades (declaração de persona non grata),
reparações financeiras, retaliações comerciais etc. Ademais, quando as normas
internacionais forem aplicáveis internamente, empregam-se os mecanismos de
sanção do ordenamento interno. Por fim, lembramos que tal deficiência não
retira o caráter jurídico do Direito Internacional.
ATENÇÃO: em suma, a regra geral é a de que os Estados não são automaticamente jurisdicionáveis
perante as cortes e tribunais internacionais.
Obs: O Tribunal Internacional de Justiça ou Corte Internacional de Justiça é
o principal órgão judiciário da Organização das Nações Unidas (ONU). Tem sede
em Haia, nos Países Baixos. Por isso, também costuma ser denominada como Corte
de Haia.
DIP X DIREITO INTERNO
Como afirmamos anteriormente, o
Direito Internacional tem impacto direto no âmbito interno dos Estados. Com
efeito, recordamos que vários atos vinculados ao Direito das Gentes dependem de
regras do ordenamento nacional, como a competência para a celebração de
tratados. Ao mesmo tempo, a maioria dos compromissos internacionais requer
ações das autoridades estatais e a execução de ações dentro dos Estados. Com
isso, em muitos casos, como no Brasil, as normas internacionais são
incorporadas à ordem jurídica doméstica, facilitando sua aplicação nos
territórios dos entes estatais, visto que se tornam imediatamente exigíveis
pelos órgãos competentes do Estado soberano.
Entretanto, é possível que ocorram,
em uma situação concreta, conflitos entre os preceitos de Direito Internacional
e de Direito interno, suscitando a necessidade de definir qual norma deveria
prevalecer nessa hipótese. A questão em apreço é polêmica, e seu tratamento
reveste-se de grande importância, em função do relevo que o Direito
Internacional vem adquirindo como marco que visa a disciplinar o atual
dinamismo das relações internacionais, dentro de parâmetros que permitam que
estas se desenvolvam num quadro de estabilidade e de obediência a valores aos
quais a sociedade internacional atribui maior destaque. Em geral, a doutrina
examina a matéria com base em duas teorias: o dualismo e o monismo.
§ DUALISMO: É a teoria cuja principal premissa é
a de que o Direito Internacional e o Direito interno são dois ordenamentos
jurídicos distintos e totalmente independentes entre si, cujas normas não
poderiam entrar em conflito umas com as outras.
·
Duas
ordens jurídicas distintas: uma nacional e outra internacional;
·
Impossibilidade
de conflito entre elas;
·
Necessidade
de incorporação por meio de dei ou ato interno.
OBS: Alguns entendimentos, como o STF, acreditam que o Brasil adota o dualismo moderado.
§ MONISMO: O monismo fundamenta-se na premissa de que existe apenas uma ordem jurídica, com normas internacionais e internas, interdependentes entre si.
· Um só ordenamento jurídico: nacional e internacional;
· Possibilidade de conflito entre elas;
· Não há necessidade de diploma interno (lei) para incorporação
OBS: A doutrina interna diz que o Brasil adora a teoria monista nacionalista.
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OBS: Alguns entendimentos, como o STF, acreditam que o Brasil adota o dualismo moderado.
§ MONISMO: O monismo fundamenta-se na premissa de que existe apenas uma ordem jurídica, com normas internacionais e internas, interdependentes entre si.
· Um só ordenamento jurídico: nacional e internacional;
· Possibilidade de conflito entre elas;
· Não há necessidade de diploma interno (lei) para incorporação
OBS: A doutrina interna diz que o Brasil adora a teoria monista nacionalista.